Questão de opinião: Saudades do Carnaval
O Carnaval acabou. E já estou com saudades. Aliás, tive saudades durante os quatro dias.
E é com esta saudades que dói no peito que acho que está na hora de refletir sobre o Carnaval de Bragança Paulista.
Claro que muita gente vai discordar do que vou dizer, mas para mim é sim uma pena só duas escolas terem desfilado. E Nove e Dragão estão de parabéns por tentar não deixar o samba morrer.
Respeito, é claro, as que optaram por não desfilar. Cada escola tem seus motivos. E como quando falamos de escola de samba, envolvemos paixão é bom deixar os extremismos de lado.
Eu, que nasci no samba, chorei muito no sábado, quando recebi uma foto da Passarela Chico Zamper vazia. Estava em São Paulo, realizando o sonho de ver o carnaval no Anhembi, pela primeira vez, e chorei.
Chorei, como chorei em 2014, quando o número de pessoas na Passarela Chico Zamper também era pequeno perto dos anos anteriores já que tentavam substituir os espetáculos das escolas, por shows de pagode e com cobrança de ingressos.
Chorei como tenho certeza que muitas outras pessoas choraram ou tiveram vontade de chorar ao desfilar na Nove de Julho e Dragão Imperial, nas condições que desfilaram, com menos componentes, menos carros alegóricos, menos brilho e encanto.
Tudo bem, que o país passa por crise. Ninguém aqui está falando que é para tirar dinheiro da saúde, segurança, educação para dar para as escolas de samba. Já dizia a música “a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte….”
Mas, não dá para simplesmente virar as costas para uma tradição que sempre levou um grande público a passarela do samba. Não dá para simplesmente ignorar o trabalho que as escolas desenvolvem.
Claro, tem muita coisa que precisa mudar. Tem sim! E, talvez, este seja o momento para reflexões por parte das escolas e também do poder público. Não dá para deixar as discussões para janeiro de 2017, até porque estamos em ano eleitoral.
O que não podemos mais aceitar é gente que gosta de generalizar e sair dizendo por ai que as escolas, ou melhor, que TODAS AS ESCOLAS, não fazem nada o ano todo e só querem o dinheiro da subvenção.
Isto só serve de discurso para quem não conhece o Carnaval de Bragança. Tem escola que desenvolve trabalho o ano inteiro sim e se você não conhece este trabalho talvez seja porque nunca esteve em uma barracão, nunca participou de um evento das comunidades.
Quem conhece o Carnaval e nossas escolas sabe que a subvenção não é suficiente para bancar o show que as escolas do grupo especial davam na avenida. Elas sempre se viraram com shows, eventos, busca por patrocínio para colocar na avenida seus componentes. E sempre fizeram isto com realeza, maestria.
Nosso povo do samba é tão bom que sempre “exportamos” para São Paulo grandes profissionais como o casal de Mestre-Sala Gih e Bozo, que durante anos desfilou na Gaviões da Fiel. Outro exemplo, mais recente disto, é o músico Fabiano Pires, que brilhou com seu cavaquinho na Mocidade Alegre.
Não dá também para falar que o público que gosta de escolas de samba é pequeno, avaliando o fracasso de público este ano. Muita gente não foi assistir Dragão e Nove porque choveu.
Muita gente não foi ver Dragão e Nove porque torce para outras escolas que não desfilaram. Muita gente não foi porque se programou e, como eu, foi assistir os desfiles em São Paulo ou no Rio.
Muita gente não foi porque temeu pela segurança com o ambiente totalmente aberto. Muita gente não foi, porque tinha dúvida de que o evento aconteceria. Os boatos e comentários de quem não haveria desfile foram intensos até o último dia.
Enfim, amanhã é quarta-feira de Cinzas, mas para mim, apesar de todo sucesso do CarnaPraça, classifico o Carnaval de Bragança deste ano como o pior de todos os tempos, Um Carnaval cinza, sem brilho.
Tenho certeza que muitos sentem como eu. Apesar de todas as apresentações que as escolas fizeram em suas quadras, ou em clubes e cidades vizinhas, sei que para os apaixonados por suas escolas, ficou aquele gostinho de quero mais. E agora, só o ano que vem…. E com um trabalho de recuperação, de superação …
Só quem já ouviu uma bateria esquentando na concentração sabe do que estou falando. Ali na concentração se ganha e se perde Carnaval. Ali na concentração se vê o amor pelas escola, histórias de superação, resultado do trabalho de um ano inteiro.
Termino este texto em lágrimas, novamente, porque queria muito estar me arrumando para ir ver a minha Azul e Branco em seu segundo dia de desfile e curtir além da Vila, o samba da Dragão Imperial, Nove de Julho e Lavapés. Mas hoje, o silêncio roubou o espaço da alegria na Passarela Chico Zamper.
A minha Vila não desfilou, eu não pintei as unhas de azul e branco e não senti a emoção que vem da arquibancada.
Lágrimas. Termino este texto em lágrimas, com lembranças de outros carnavais como do saudoso Rei Momo Abobrinha, as apurações no Ginásio de Esportes, cheia de rivalidade na arquibancada, o protesto realizado pela Acadêmicos da Vila, que parou o desfile no meio e cantou o samba “Vou Festejar”.
Saudades….
Enfim, termino este texto ouvindo o samba eternizado na voz da Bete Carvalho ” Volta por Cima” e é justamente este o recado que deixo para quem ama o Carnaval de Bragança Paulista “Reconhece a queda e não desanima. Levanta, sacode a poeira, e dá a volta por cima…”
Ana Maria de Oliveira
Jornalista